Diálogo sobre Igualdade de Género e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)

No âmbito dos desafios consagrados na Agenda 2030, com especial foco nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), teve lugar a iniciativa “Diálogos 345- Igualdade e ODS /Agenda 2030”, no Camões – Instituto da Cooperação e da Língua.

Diálogo sobre Igualdade de Género e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)

Com esta iniciativa conjunta da P&D Factor, Camões, IP e Gabinete da Secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, reunimos um importantes contributos para o melhor conhecimento dos ODS e cumprimento das respetivas metas, em especial as consagradas no ODS 5 (Igualdade de Género e Empoderamento de Mulheres e Raparigas) com impacto em todos os demais. Conhecer, articular, colaborar na implementação, Questionar e requerer políticas públicas coerentes e Monitorizar e Avaliar o impacto da concretização destes ODS nas questões de Género, Educação, Saúde, incluindo a Sexual e Reprodutiva, Economia, Participação, Direitos Humanos e Desenvolvimento foram algumas das propostas apresentadas por representantes da sociedade civil (OSC/ONG), investigadoras, agentes de decisão técnica e política, parlamentares e profissionais de entidades públicas.

De largo consenso e de compromisso global, a Agenda 2030 não pode deixar ninguém para trás ou esquecido, mas isso exige uma ação concertada e imediata para alcançar as metas que se desejam transformadoras e realizáveis para se alcançar o pleno desenvolvimento.

Com moderação de Alice Frade (P&D Factor) e Teresa Fragoso (SECI), o debate teve a seguinte ordem de trabalhos:

Ordem de Trabalhos
9:30Abertura e Enquadramento
  Catarina Marcelino, Secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade
 

Gonçalo Teles Gomes, Vice-Presidente do Camões, IP

 

Mafalda Tello, Direção P&D Factor

10:00“Agenda 2030: Que ações em matéria de igualdade – diálogo intersetorial, políticas públicas, cooperação e indicadores”
  Alexandra Silva, PPdM
  Dalila Cerejo, Investigadora na UNL
  Mónica Ferro, Docente no ISCSP
  Sérgio Carvalho, Ministério Negócios Estrangeiros
  Paula Lopes, Camões - IP
10:45Perguntas e respostas
11:00“Contributos em matéria de Igualdade para o Plano de Execução dos ODS/Agenda 2030 em Portugal - planos interno e externo”.

Participantes

12:45Intervenção de parlamentares
13:00Encerramento

Texto de Abertura da P&D Factor

Bom dia a todas e a todos

Começo, naturalmente, por agradecer, em nome da P&D Factor, à Senhora Secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Dra. Catarina Marcelino, e ao Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, na pessoa do seu Vice-presidente, o Embaixador Gonçalo Teles Gomes, a parceria que permitiu esta iniciativa. O nosso muito obrigado também a todas as pessoas e organizações que aceitaram o convite para integrar este Diálogo que visa uma participação cidadã e representativa.

O que aqui nos traz hoje é a necessidade de decidir.

Decidir se queremos ser observadores de mais um texto que reflecte um compromisso ambicioso e cujas lacunas, desafios ou avanços iremos acompanhar ao longo dos próximos 14 anos. Ou se pretendemos ser agentes esclarecidos e empenhados na implementação de acções capazes de transformar a humanidade de que fazemos parte e o mundo em que vivemos.

A proposta da série de Diálogos 345, que começou no passado dia 19 de Abril com o “Diálogo Juventude e os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável”, realizado em parceria com o CNJ e o Camões, IP, resulta do compromisso, assumido pela P&D Factor, de promover e defender a igualdade de todas as pessoas e o seu direito aos benefícios do saber e do desenvolvimento, num contexto de universalidade dos direitos humanos. Hoje, a proposta de diálogo centra-se na igualdade de género e Empoderamento. Iremos, por isso, concentrar a nossa atenção na temática da Agenda de 2030 e nos ODS que contribuem mais directamente para a realização de todos os 17 Objectivos e a consecução das suas 169 metas.

É inevitável recordar hoje, aqui, as grandes conferências internacionais das Nações Unidas dos anos noventa, que tiveram um papel fundamental no debate conceptual alargado e, em alguns aspectos, profundamente inovador sobre temas de direitos humanos, incluindo muito concretamente o direito ao desenvolvimento económico e social, e no estabelecimento de compromissos e objetivos concretos. Se há quem considere que os recursos e tempo dedicados a essas conferências não foram devidamente compensados, porque os resultados obtidos foram fracos, outros há – e é com estes que nos identificamos – que, reconhecendo que os resultados ficaram aquém do que era justo e desejável, valorizam, no entanto, a formulação de novos conceitos, a afirmação de direitos ignorados ou subalternizados e o aparecimento e forte participação de novos actores, sem, por isso, ignorarem as reduzidas mudanças significativas ocorridas ao nível da actuação dos Estados.

Não é possível conseguir avanços ambiciosos em matéria de direitos humanos esquecendo ou tornando invisíveis as Agendas inovadoras e inacabadas do Cairo (CIPD, 1994) e de Pequim (1995), um legado que é nosso dever relembrar constantemente. O reconhecimento e a promoção dos direitos humanos e do Desenvolvimento Global só serão uma realidade (como, aliás, reconheceu a avaliação do impacto dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio e é explicitamente afirmado na resolução sobre a Agenda 2030) quando a Saúde Materna, a Saúde Sexual e Reprodutiva, a igualdade de género e o fim de todas as formas de discriminação e violência sobre meninas, raparigas e mulheres forem uma prioridade e se concretizarem em acções incluídas nas agendas perpétuas e inacabadas que deverão ser transformadoras, mesmo no que se refere aos paradigmas que lhes estão subjacentes.

A Agenda 2030 constitui um roteiro assente no amplo consenso em torno da ideia de que alcançar a igualdade de género é fundamental para a realização dos Objectivos globais. Mas, para que as pessoas visadas pela Agenda sejam beneficiárias do progresso e dos avanços em matéria de participação, teremos de, para além de incentivar iniciativas e diversificar acções, reforçar o conhecimento de parlamentares e da sociedade civil e reforçar igualmente os processos de avaliação e a responsabilização. A agenda, por si só, não muda a vida das pessoas. É o quadro legislativo, são as prioridades políticas e orçamentais coerentes em matéria de políticas públicas que o fazem. Por isso, a P&D Factor afirma que a escolha depende de todos e de todas, exigindo diálogos descomplexados e sem protagonismos que não fazem sentido nem servem as causas que pretendemos promover. É preciso envolver todos e não desperdiçar ou coartar as oportunidades de ação.

Entendemos que é fundamental conhecer o ponto de partida e ter a certeza do ponto de chegada pretendido, para, em função de ambos, estruturarmos as mudanças e mobilizarmos os investimentos necessários. Precisamos de, como país e comunidade global, estimular a ação para combater insuficiências e discriminações. Os meus netos usufruem, hoje, dos benefícios decorrentes de muitos dos instrumentos nacionais e internacionais de direitos humanos e de desenvolvimento que outras gerações lhes legaram. E os novos desafios que a geração dos meus filhos e a minha própria lhes deixarão irão confrontá-los com realidades que, desejo, lhes permitam viver plenamente a sua humanidade e contribuir para tornar mais humana, mais digna e mais justa a existência dos que virão depois deles.

O que quis e quero para mim e para os meus é o que quero para todas as mulheres, homens, jovens e crianças do mundo. Nem mais, nem menos.

A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, subscrita integralmente e sem reservas por Portugal, afirma, em termos inequívocos, que é preciso reconhecer, na prática, que a igualdade de género e o empoderamento das mulheres, tal como a contribuição dos e das jovens e a papel da sociedade civil na plena implementação da Agenda, exigem não só mais atenção como um acompanhamento e avaliação constante.

A nosso ver, era muito importante assegurar que as mulheres, as raparigas, e a igualdade de género estivessem no centro da agenda dos ODS. Tê-lo conseguido foi, certamente, uma grande vitória, mas não é suficiente. É difícil (ousaria mesmo dizer impossível) atingir os objectivos ambiciosos acordados, sem planos e acções concretas. É fundamental trabalhar em conjunto e medir os progressos, para tornar essa agenda “ousada” uma realidade para as raparigas e as mulheres. Mas isso também não bastará, se não nos entendermos quanto ao que está em causa: o presente e o futuro do país, da região e do mundo, graças ao investimento em questões de população como a educação e saúde sexual e reprodutiva, com planeamento familiar, parto assistido, fim de todas as formas de discriminação e violência, incluindo a de género, o empoderamento, a participação, a decisão política, o acesso a recursos, a emprego e a financiamentos.

Reconhece-se hoje que o ODS 5 será ou o impulsionador ou o obstáculo à realização de toda a Agenda 2030. A sua ligação e interdependência em relação a todos os ODS e à Agenda 2030, incluindo em matéria de financiamento, exigem que, também em Portugal, as estratégias e planos sectoriais de Saúde, de Igualdade, de Economia, de Educação ou de Cooperação reflictam a forte interdependência quanto ao seu modus operandi, o qual deve assentar na visão das pessoas como sujeitos de direitos humanos.

O que temos pela frente é um trabalho e investimento contínuos, a promoção de uma postura adequada de solidariedade, responsabilidade política e cidadã, junto das escolas, das famílias, dos responsáveis pelos programas de financiamento, da sociedade civil, das empresas e do sector privado em geral e também dos serviços públicos. Um trabalho continuado que exige tempo, recursos, saber e monitorização constantes, com vista a garantir a correcta implementação de estratégias que permitam chegar às pessoas nas diferentes fases da sua vida.

Precisamos de programas mais diversificados com novas dinâmicas, abordagens e actores que olhem para as organizações da sociedade civil como agentes plurais, fruto de vontades sociais mas com lógicas, dinâmicas e recursos diferentes dos do sector empresarial privado.

Precisamos de devolver à igualdade de género, à educação e à saúde sexual e reprodutiva o seu paradigma de direitos humanos. Precisamos de insistir em que, no quadro das políticas de desenvolvimento local e mundial, a pessoa é o sujeito central do desenvolvimento pelo que as políticas de desenvolvimento devem promover que as pessoas sejam os principais participantes e beneficiárias dos processos de desenvolvimento.

Precisamos de um meio académico e de um sector de investigação fortes, com conhecimentos sólidos, entrega ao serviço público e uma dinâmica nacional e mundial.

Precisamos de dados demográficos fiáveis e atuais que enformem as políticas nacionais e que possam ser utilizados para garantir progresso e monitorização dos compromissos, incluindo os ODS. Daí a importância da recolha, análise e difusão de dados demográficos e estatísticas desagregados por rendimentos, sexo, idade, estatuto de migrante, deficiência, localização geográfica e outras características relevantes em contextos nacionais, para a formulação de políticas, incluindo de cooperação, por todos os países.

Não é possível falar, hoje, de direitos humanos, igualdade e desenvolvimento sem falar das migrações e, em particular, das ondas massivas de refugiados. As migrações são uma realidade inerente ao mundo globalizado e, sabemos, representam hoje novos e enormes desafios, devido ao seu volume, abrangência, complexidade e impacto que não podíamos prever, até há pouco tempo e, muito menos, nos anos 90, quando foram adoptados o Plano de Acção do Cairo e a Plataforma de Acção de Pequim.

Neste preciso momento decorre, em Istambul, a Cimeira Humanitária Mundial, no âmbito da qual estão a ser discutidas questões prementes como a igualdade de género, a saúde sexual e reprodutiva das migrantes e refugiadas e os direitos destas mulheres nessa esfera absolutamente vital. Aguardemos a informação sobre a Cimeira, na esperança que dela saiam compromissos e iniciativas concretas nestes domínios.

A terminar, gostaria de referir aqui que a P&D Factor se associa aos apelos nacionais e internacionais para incentivar, neste caso concreto Portugal, a elaborar pelo menos dois relatórios e avaliações da situação, a título voluntário, entre 2016 e 2030, para que não se perca a ênfase nas pessoas e não se corra o risco de comprometer a ambição dos ODS.

Contem connosco, desde já. A P&D Factor está disponível para participar, para apresentar e debater propostas, para mobilizar a sociedade civil e outras partes interessadas, incluindo responsáveis políticos. Apelamos, assim, ao Governo, aos organismos públicos, aos meios académicos e às ONG, para que que tomem medidas concretas para a inclusão e monitorização da igualdade de género e de todas as metas acordadas no ODS 5 e na Agenda 2030. É crucial assegurar a visibilidade destas questões, gerar os meios necessários e manter o espaço para o acompanhamento das questões a todos os níveis.

Oiçamos o que as diversas partes têm a dizer sobre estas questões. E, através da reflexão, do debate e do diálogo, contribuamos para que os compromissos assumidos no âmbito da Agenda 2030 sejam capazes de gerar mudanças concretas que tornem a igualdade de género, a saúde materna, a saúde sexual e reprodutiva e a eliminação da violência contra as raparigas e as mulheres uma realidade em todo o mundo. Se não mais cedo, pelo menos até 2030, com uma avaliação em 2020 que revele uma evolução clara nessa direcção.

 

Muito obrigada.

 

Mafalda Tello, P&D Factor

24 Maio 2016