Perfil

. Vale sempre a pena lutar pelos nossos ideais

Fotografia de Mónica FerroMónica Ferro “É efetivamente necessária uma revolução paradigmática que afirme direitos e saúde sexual e reprodutiva como desbloqueadores de mais saúde, mais direitos e mais produtividade. Tudo traduzido em políticas públicas bem informadas, financiadas e monitorizadas.”

Fotografia: Tiago Lopes Fernandez

B.I.

Nome: Mónica Ferro

Partido: Partido Social Democrata

Comissões Parlamentares: Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do PSD. Comissão de Defesa Nacional, Comissão de Ética, Cidadania e Comunicação Social, Subcomissão de Igualdade, Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas. Coordenadora do Grupo Parlamentar Português sobre População e Desenvolvimento. Vice Presidente do Fórum Europeu de Parlamentares para a População e Desenvolvimento.

Deputada desde: 2011

O maior desafio no Parlamento: A conciliação entre aquilo que queremos fazer, o que somos capazes de encetar e o que conseguimos efetivamente realizar.

Ser deputada vale a pena? Sim. Vale a pena todos os dias: os de missão cumprida e os de frustração.

Projeto que lhe encheu as medidas: a autonomização do crime de mutilação genital feminina e todo o processo em torno da ratificação e implementação da Convenção de Istambul.

Direitos e Desenvolvimento

Direitos humanos, saúde e igualdade. O que vale esta trilogia? Vale desenvolvimento e dignidade. Vale, ainda, segurança e paz. Saúde e igualdade são direitos humanos estruturantes, os alicerces de uma sociedade justa, segura e desenvolvida. Esta trilogia é uma das traves mestras de um mundo mais digno para todo/as.

Maior desafio na área da saúde em Portugal: Garantir o acesso universal à saúde – que é dos fitos inscritos no código genético do PSD.

E no mundo: A universalização do acesso à saúde, e gostava de destacar o acesso à saúde sexual e reprodutiva. É uma das áreas menos priorizadas pelos programas de nacionais e pela agenda da cooperação nos países em desenvolvimento; contudo é dos investimentos mais produtivos que um país pode fazer: melhora a saúde materna e infantil, liberta as mulheres para um processo de empoderamento e faz crescer a produtividade das economias. Trata-se de um investimento, não de um custo.

As visitas de trabalho com o EPF e UNFPA valem a pena? Conhecer as realidades locais, sobre as quais tentamos agir e provocar alterações, enquadrado/as num cenário mais amplo e informado, é vital para ação e para a eficácia dessa ação. Além desta componente mais orientada para os resultados, estas visitas permitem reforçar a ideia de humanidade partilhada.

Identifique obstáculos aos direitos e à saúde sexual e reprodutiva: A lista tem tanto de longa, quanto de exasperante. Ou seja, os obstáculos são sobretudo fruto de padrões de pensamento e de comportamentos que têm pouca adesão à realidade, baseiam-se em ideias pré-concebidas do que é o papel da mulher na sociedade e de quais as suas atribuições. Entre eles encontramos a ideia de que os direitos e a saúde sexual e reprodutiva se cinge à saúde materna, que há um número de mortes maternas (por causas evitáveis, claro está) que é aceitável (de todo o modo como o fez o ODM 5), que há um grau de violência de género que é cultural ou socialmente aceite e tolerado, que os recursos investidos na educação, prevenção, formação e resposta nestas matérias são custos e não investimentos. É efetivamente necessária uma revolução paradigmática que afirme estes direitos e saúde sexual e reprodutiva como desbloqueadores de mais saúde, mais direitos e mais produtividade. Tudo traduzido em políticas públicas bem informadas, financiadas e monitorizadas.

E oportunidades: Este milénio começou com a frase: somos a primeira geração que pode acabar com a pobreza e com a constatação que tínhamos os saberes e os meios para o fazer. E que o mundo não nos perdoaria se não o fizéssemos – gosto de lembrar. Isto significa que a agenda de cooperação para um desenvolvimento sustentável, para o pós-2015, que se encontra em fase acelerada de conceção é a oportunidade para desconstruirmos os mitos que ainda povoam esta matéria, de a priorizarmos e de lhe alocarmos os recursos necessários. Já se conhecem os ganhos em saúde, igualdade e direitos humanos dos investimentos nesta área; já se conhecem as mais-valias de justiça, paz e segurança de uma agenda que afirme todos os direitos para todas as pessoas, e esta é uma oportunidade de construção de um mundo melhor que não pode ser negligenciada. Parafraseando Almada Negreios, todas as frases que hão-de salvar a humanidade já estão escritas, só falta uma coisa: salvar a humanidade. Investir nos direitos e saúde sexual e reprodutiva é começar a salvar a humanidade.

Igualdade de género em Portugal. Verdade ou aspiração? Não se pode responder a uma questão destas com um sim ou um não. Qualquer uma das respostas é limitadora, pois, se por um lado, nunca se fez tanto do ponto de vista legislativo, formativo e de criação de uma consciência social para o tema, pelo outro é inegável que persistem arquétipos e preconceitos de menorização e subvalorização da mulher que são verdadeiros muros mentais. As violências de género, em especial a violência doméstica, e a pouca representação das mulheres nos órgãos de tomada de decisão económica, aliadas à desigualdade salarial, mostram-nos que a igualdade é uma aspiração para cuja concretização temos lutado. Os resultados de persistentes melhorias mostram que finalmente estamos no caminho certo.

Sociedade civil mais forte. Sim ou um empecilho? Claro que sim. Tenho-o sempre defendido, quer trabalhando com a sociedade civil organizada, quer criando organizações de sociedade civil. Uma sociedade civil mais forte é fundamental para uma boa governação, sendo mesmo critério de avaliação da qualidade das democracias.

Migrações. Um problema dos outros ou uma responsabilidade de todos? As migrações são marca da humanidade que sempre se afirmou como um povo em movimento. Não há uns/umas e outro/as neste empreendimento; há, outrossim, uma responsabilidade feita oportunidade de gestão comum. Ou seja, as migrações são uma oportunidade para que as sociedades se recriem de saberes e pessoas – as migrações permitem reequilibrar défices demográficos, compensar o envelhecimento de determinadas populações, por exemplo, e, em simultâneo, gerar possibilidades para mais formação, melhor especialização e vidas mais dignas para algumas pessoas. Tudo isto conflui num processo em que ambas as partes – países de origem e países hospedeiros – beneficiam. Este processo tem sido levado para lá dos seus limites nos últimos anos. O aumento do número de pessoas que deixam as suas casas por força dos conflitos, das alterações climáticas, das perseguições e das fragilidades dos seus Estados lançou luz sobre uma realidade que não é nova mas que agora é desocultada. Claro está que o conflito na Síria, na área em disputa pelo estado islâmico, no Afeganistão, e em demasiados outros pontos do planeta, provocaram um exacerbar dos números e das tragédias associadas aos mesmos. Isto desencadeou uma rutura dos conceitos, dos mecanismos de acolhimento e das respostas em campo para estas pessoas. Nem todas as pessoas que tentam chegar à Europa em busca de uma vida são migrantes irregulares, entre elas há muito/as refugiados/as, mas também há migrantes económicos – este e outros mitos têm que ser debatidos e desmontados. Para todo/as, sem exceção, tem que haver uma resposta europeia e global. É a dignidade comum que está em causa.

Investigação académica e decisão política. Há alguma relação de verdade? A investigação académica está ligada à decisão política não só porque a estuda mas também porque a informa. A tomada de decisão em política tem que contar com os saberes gerados nas academias e deve estar alerta às interpelações que a academia vai veiculando. Há uma relação biunívoca que pode e deve ser estimulada com ganhos evidentes para ambas as partes.

Identifique os três maiores desafios ao desenvolvimento: Isto daria um tratado em vários tomos; mas correndo o risco de simplificar demasiado, diria o distanciamento que há entre os povos dos países desenvolvidos e os povos dos países em desenvolvimento – os primeiros são pouco proactivos no apoio aos últimos e mobilizam poucas vontades políticas em torno da cooperação para o desenvolvimento. O segundo obstáculo está relacionado com a falta/ineficiente gestão de recursos financeiros; não é verdade que não existam recursos, mas é verdade que os mesmos não produzem os resultados que todo/as esperamos. O terceiro desafio prende-se com a definição de uma agenda de desenvolvimento com prioridades bem elencadas e, sobretudo, baseadas na análise de boas práticas e de provas de eficácia. Isto fica patente no facto de sabermos que compensa investir nas mulheres e na sua saúde sexual e reprodutiva, mas tardarmos a assumir essa abordagem nos documentos estratégicos da cooperação internacional.

E os três maiores desafios colocados à cooperação portuguesa: Entre muitos outros destacava o mobilizar as vontades populares e políticas em torno do apoio à cooperação para o desenvolvimento; galvanizar os parceiros do sector privado para as virtudes e oportunidades da cooperação para o desenvolvimento; manter a voz assertiva e proactiva que conquistou nos últimos anos nos fora internacionais e nas negociações em curso. Este é um capital que, embora de valor intangível, é crucial para a nossa afirmação internacional.

Ano Europeu para o Desenvolvimento. Vai valer a pena se: o povo da União Europeia compreender que a cooperação para o desenvolvimento é justiça à escala global e que é apenas um pequeno contributo para um mundo mais justo para todo/as.

Mónica Ferro - Marcas Pessoais

Fotografia de Mónica Ferro

Lema de vida: Vale sempre a pena lutar pelos nossos ideais, mesmo quando os obstáculos parecem intransponíveis.

Uma causa: Fim das violências de género e empoderamento das meninas, raparigas e mulheres.

Uma líder: Não tenho, nunca tive, mas sinto falta.

Um hábito: Ler. Sou uma leitora compulsiva. Sinto-me diminuída se não tiver um livro à mão.

Um livro: A Guerra do Fim do Mundo, de Vargas Llosa

Um filme : Até ao fim do Mundo, de Win Wenders

Um desejo : Um mundo sem desigualdades e, logo, sem violências.

Um compromisso: Todos os dias fazer algo para tentar construir um mundo melhor.

Se não fosse deputada seria: Tenho sempre que sou docente universitária e estou deputada. Se não estiver deputada seria o que sempre fui, professora.

 

Mónica Ferro