. Posfácio da Presidente da P&D Factor Graça Campinos Poças, na brochura “Too young to Wed / Novas Demais para Casar”

In, Too Young to Wed / Novas Demais para Casar, Posfácio, pg 24-25, Lisboa, 2014:

É preciso mudar os paradigmas de desenvolvimento para que palavras como Direitos, Saúde, Educação, Igualdade, Justiça sejam realidade para todas as pessoas. Os ganhos alcançados e os desafios resultantes de compromissos globais e locais, como a Convenção dos Direitos da Criança, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação sobre as Mulheres (CEDAW), o PoA do Cairo de 1994 (CIPD), a Plataforma de Acção de Pequim de 1995, os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (2000) e seguintes provam-no.

Uma abordagem de ciclo vital que responda coerente e consistentemente às tarefas de crescimento bio-psico-social de cada uma e de todas as pessoas, assegura a prevenção de riscos mas é, sobretudo, promotora da autonomia e da responsabilização. Esta abordagem é possível quando políticas e programas colocam as pessoas como centro da sua principal actuação e promoção de uma cultura de cidadania, de não discriminação e de não-violência.

Os números que diariamente nos são apresentados pelos mais diversos estudos, sondagens e relatórios nacionais e internacionais sobre a pobreza, a violência de género, as violações em situação de guerra, conflito ou crises humanitárias e económicas, os maus tratos infanto-juvenis e as mortes maternas têm frequentemente tantos zeros à direita, que facilmente esquecemos que correspondem a pessoas concretas, ligadas a famílias...são filhas, netas, esposas, tias, primas ou irmãs de alguém.

Os paradigmas e quadros de referência de Desenvolvimento e Direitos Humanos têm efeitos directos nas normas sociais. É preciso e possível fazer mais e melhor para que as famílias e as comunidades, sem excepção, percebam e reconheçam os perigos, os riscos e os impactos de práticas nefastas e que, simultaneamente, identifiquem e tenham à sua disposição alternativas específicas e de efeito global, como programas e cuidados de educação para a saúde e cidadania, de educação e saúde sexual e reprodutiva, incluindo saúde materna e parto seguro, de prevenção de VIH/SIDA, de maternidade e paternidades planeadas e desejadas, de saúde infanto-juvenil, de formação ao logo da vida, de igualdade e trabalho digno, sempre com a necessária protecção social, incluindo às pessoas em situação de particular vulnerabilidade.

Com Too Young to Wed / Novas Demais para Casar enfrentamos os rostos e conhecemos alguns momentos das vidas de meninas e raparigas, mas também de alguns rapazes, a quem as expectativas de futuro foram marcadas e cerceadas por padrões socio-culturais que não as e os reconhecem como sujeitos de direitos e agentes de desenvolvimento. Muitas destas meninas noivas e as jovens já casadas são vistas como mercadoria transacionável, essencial ao rendimento e subsistência das famílias, bem- estar e prestígio familiar, em violação sistemática de diferentes instrumentos jurídico- legais nacionais e internacionais.

Investir em prevenção significa também que não podemos esquecer as meninas grávidas e/ou já mães, que enfrentam situações de vulnerabilidade e de risco, a quem é crucial garantir acesso efetivo aos sistemas de educação e de saúde, incluindo serviços e cuidados compreensivos e não-discriminatórios, de saúde sexual e reprodutiva.

Quando lemos o Relatório “Marrying Too Young: End Child Marriage” (UNFPA:2012) percebemos que muitas famílias e até líderes formais acreditam e defendem que estão a proteger as jovens da violência sexual e do abandono, ao mesmo tempo que lhes asseguram o único futuro que conhecem para as meninas e mulheres: esposas, cuidadoras e mães. À luz de todos os compromissos, acordos e resultados, precisamos de investir e divulgar mais as alternativas e apresentar soluções.

A dimensão internacional dos casamentos infantis, precoces e forçados, exige maior atenção de responsáveis de governos – política externa, saúde, igualdade, educação, justiça, protecção social e economia-, de parlamentares, de vários agentes de cooperação e da sociedade civil. Centrados nos direitos humanos e projectados no desenvolvimento, os problemas não são de outros, são problemas de todos que requerem acção concertada e global aos e nos vários fora.

Sabemos, na P&D Factor que, em situações de pobreza, de conflito e de crise, os direitos sociais são os mais atingidos, com efeitos imediatos na destruturação das famílias e comunidades e o quão mais fácil parece ser demonstrar a solidariedade perante a catástrofe e as vítimas colaterais. Mas quando observamos os 41 países com maiores índices de casamentos antes dos 18 anos, entendemos que, enquanto país e comunidade (também na UE, CPLP, CEPAL e ONU) não podemos deixar de questionar e redimensionar as nossas prioridades, essencialmente no contexto das negociações da Agenda Pós-2015, para o que realmente conta: as pessoas.

A participação e contributo das organizações da sociedade civil, enquanto observatórios, barómetros e parceiras nas soluções para o uso fruto dos direitos fundamentais e implementação de políticas públicas, importa ser mais agilizada, reconhecida e consistente a nível global. A Campanha Continuamos à Espera e a Exposição Too Young To Wed/Novas Demais para Casar são dois exemplos do muito que se pode ainda fazer, individual e colectivamente, para as soluções que são necessárias. Não se pede, não se exige o fim do casamento infantil, forçado e precoce e de outras práticas nefastas à saúde e direitos das meninas e raparigas por questões culturais ou políticas, mas sim porque o seu fim corresponde a ganhos em qualquer indicador de desenvolvimento e direitos humanos, a nível pessoal, local, nacional, regional e global.

Às ONGD parceiras da Campanha Continuamos à Espera, ao Camões-Instituto da Cooperação e da Língua, ao UNFPA, à Agência VII, à Caixa Geral de Depósitos e a todas as pessoas, voluntárias e profissionais, que nos apoiam e acompanham nesta missão o meu e nosso Obrigada. 

Graça Campino PoçasGraça Campinos Poças

Presidente da P&D Factor - Associação para a Cooperação sobre População e Desenvolvimento

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