Entrevista

. ”Os Direitos Humanos têm de estar acima de tudo”

Sampaio da NóvoaSampaio da Nóvoa assume-se defensor incondicional da liberdade, da igualdade e dos direitos humanos. Apesar de “avanços consideráveis” nestas áreas, há muito trabalho a fazer, nomeadamente no domínio da igualdade de género. O candidato à Presidência da República acredita que chegará um tempo em que não importa ser mulher ou homem para ocupar lugares cimeiros de decisão e se vier a ocupar o lugar, garante, dará voz a esse desígnio.

Entrevista: Carla Amaro / Fotografias: Paulo Vaz Henriques

Como se posiciona na defesa e promoção dos direitos humanos e do Desenvolvimento, quer no contexto de Portugal, quer na Lusofonia?

Um país só pode ser verdadeiramente desenvolvido se tiver assegurado o cumprimento dos direitos humanos e se a sua sociedade assentar em pilares sólidos de coesão e igualdade social. Igualdade que passa por cerzir um tecido social forte e afetivo, baseado na solidariedade, na não discriminação em função das desigualdades económicas, de género, orientação sexual, país de origem, etnia, ou opção religiosa. Coesão que passa por estar particularmente atento, também, a todas as pessoas socialmente fragilizadas, como por exemplo as crianças e os idosos que se encontram em risco de pobreza e de marginalização.

As situações de violência doméstica e de género, enquanto expressão mais dramática de tais desigualdades, que tanto afetam no presente, os adultos, as crianças e os jovens, como as gerações futuras, devem merecer uma atenção particular do Presidente da República.

Muitos dos avanços de Portugal e do mundo se devem ao grande esforço e investimento no multilateralismo. Em matéria de Saúde e no contexto das Nações Unidas, por exemplo, os contributos da OMS e do UNFPA foram decisivos, bem como da CSW. Como vê, atualmente, o contributo de Portugal para as Nações Unidas e para a sustentabilidade do Desenvolvimento, também em matéria de direitos humanos?

Comprometo-me a ser um Presidente de causas, em particular as que dizem respeito à liberdade e à dignidade de todas as pessoas. A defesa do acesso universal a cuidados de saúde é um pilar central na minha candidatura e, como é óbvio, se defendo isso para o meu país, considero que todos os cidadãos, do mundo inteiro, deviam ter esses direitos assegurados. Mas sinto que, infelizmente, Portugal não tem tido voz não só na Europa mas também no mundo. Portugal precisa de afirmar a sua voz no mundo. Sempre fomos um país universalista, humanista e essas nossas características têm sido como que “abafadas” para demostrarmos que somos bons alunos. Ora, os bons alunos não são aqueles que estão sempre calados e aceitam todas as premissas como boas. Não. Eu, mais ainda sendo professor, considero que o bom aluno é o que participa, o que fala, intervém, questiona, pensa, ajuda a encontrar soluções. E nós, nesse sentido, temos de voltar a ter voz no palco internacional. Principalmente em matérias de desenvolvimento, igualdade de direitos e direitos humanos. Bater-me-ei por isso, caso seja eleito Presidente da República.

No âmbito dos países da CPLP, como vê o papel da Presidência da República?

Mais importante do que olhar para o passado é encarar o futuro e analisar como deve ser o papel da Presidência da República e de Portugal na CPLP daqui para a frente. Considero que a Presidência da República deve defender uma Comunidade virada para as questões dos direitos humanos e do desenvolvimento. E deve ser um empenhado promotor em defesa da língua portuguesa no mundo. A língua portuguesa constitui um dos nossos principais patrimónios, porque nela se simbolizam as ligações que serão decisivas para o século XXI, não apenas no plano cultural, mas também no plano económico e político.

E nesse aspeto, qual será a prioridade acaso venha a ser eleito?

Uma das minhas prioridades como Presidente da República será honrar, salvaguardar e valorizar a extraordinária riqueza das culturas que se expressam em Português, que se ligam pela história, pelas emoções e por uma essência comum. É nos diferentes espaços do mundo de língua portuguesa que se define uma nova visão geoestratégica para Portugal, europeia e atlântica, na qual ocupam um papel importante as comunidades nacionais que vivem no exterior. Mas há um aspeto fundamental para mim no quadro da CPLP: a questão da defesa dos direitos humanos.

Quando, em 2017, Portugal exercer a Presidência da CPLP, o que é que vai defender?

Defenderei intransigentemente a bandeira dos direitos humanos. Exercerei uma Presidência em nome da liberdade e dos direitos humanos. Todos reconhecemos que este é um tema de uma enorme complexidade no plano internacional. Mas, para mim, com tudo o que isso comporta, as questões da liberdade e dos direitos humanos têm que estar acima de tudo. Julgo que temos que ser capazes de encontrar um registo de intervenção e de relação internacional em todos os planos, seja com os países da CPLP, seja na Europa, seja com os EUA, seja com a China, seja com a América do Sul, em que, respeitando as opções normais dos diversos países e povos, nunca deixemos de levantar as bandeiras da liberdade e dos direitos humanos. Encontrar-me-ão sempre desse lado. Eu não fico encima do muro. Encontrar-me-ão sempre no lado das liberdades e dos direitos humanos.

“Preocupa-me muito o desprendimento dos atuais líderes mundiais com as questões da população, da pobreza, das desigualdades, do desenvolvimento. Sinto que não há uma vontade efetiva de combater esses problemas.”

Como acompanha (e que visão tem para) os temas de População e Desenvolvimento, quando os desafios são crescentes em matéria de desigualdades?

Não podemos viver numa sociedade exclusivamente assente em números e em quadros excell. Os números são importantes, mas são apenas uma das componentes da realidade, não a única. Até estudei matemática, por isso sou insuspeito, mas defendo as causas sociais e as pessoas. Confesso que me preocupa muito o desprendimento dos atuais líderes mundiais com as questões da população, da pobreza, das desigualdades, do desenvolvimento. Sinto que não há uma vontade efetiva de combater de forma global e genuína esses problemas, que são também os nossos problemas. E estes temas não são de esquerda ou de direita. Defendo um rumo solidário para a sociedade, e claro que também para Portugal. Por isso me comprometo que serei Presidente com todos os portugueses, cuidando de maneira especial dos mais frágeis, dos mais sacrificados pela crise, dos mais desprotegidos. Exercerei a Presidência humanamente.

Como analisa a participação cada vez maior das mulheres na universidade?

Felizmente as mulheres têm vindo a conseguir romper as barreiras e os tetos invisíveis que têm dificultado o seu acesso a determinadas atividades, lugares de poder e de tomada de decisão. Tal é o resultado de uma luta com mais de um século e que tem contado sobretudo com a ação das mulheres, mas também de alguns homens que não se consideram completamente livres enquanto viverem em uma sociedade com essa falha social. Um longo processo com grandes vitórias, mas onde ainda falta fazer muito.

Um pouco por toda a Europa, mas também em Portugal, sobretudo depois do 25 de Abril de 1974, as mulheres estão cada vez mais nas universidades e são um pilar fundamental da produção do conhecimento, que é absolutamente indispensável à construção do Portugal moderno do futuro, como está bem patente na minha Carta de Princípios e tenho repetido insistentemente em múltiplas intervenções públicas.

Esta é a parte cheia do copo. A vazia é que ainda há poucas mulheres nos lugares cimeiros das universidades e da ciência. Veja-se a quase ausência de mulheres reitoras de universidades e na direção dos centros de investigação.

E na política? Há mais mulheres hoje na política ativa, mas, mesmo assim, em número insuficiente…

Esse é outro domínio onde, em Portugal, também houve avanços consideráveis da participação das mulheres. Todavia, ainda há muito a fazer: por exemplo, se na esfera parlamentar a percentagem das mulheres se vai aproximando dos 33%, previstos na lei das quotas, no poder local, apesar de ter sextuplicado de 1979 para 2013, nas últimas eleições autárquicas situava-se em 7,5%. Nas Presidências de Câmaras Municipais os valores são ainda mais baixos.

Mas a situação é igualmente marcante se olharmos para os lugares cimeiros das grandes empresas cotadas na Bolsa e que fazem parte do PSI20: uma ausência total. As mulheres estão nos lugares de apoio à decisão; e não estão nos lugares de topo de tomada de decisão. Parece repetir-se um qualquer fatalismo histórico que as coloca sempre atrás dos homens e não lado a lado. Um fatalismo que as remete para os lugares “do cuidar” e “do apoiar” quem lidera e não de liderar em igualdade de oportunidade com os homens. Só porque são mulheres!

Chegará um tempo em que nada importa ser mulher ou homem para ocupar esses lugares. Tal será uma coisa natural. Como Presidente da República, quero que a minha Palavra constitua um forte contributo para isso.

Até que ponto as questões da igualdade de género devem estar na agenda do presidente da república? E com que prioridade?

As questões da igualdade (e dos direitos humanos) deverão estar entre as prioridades da atenção do Presidente da República, como já referi anteriormente. Ao dar visibilidade às situações de desigualdade e de não respeito dos direitos humanos, o Presidente da República assume o seu dever de fazer respeitar a Constituição, o que inclui, exatamente, verificar se as políticas de igualdade estão a ser cumpridas.

Qual deve ser o papel do PR na promoção destes temas?

Através da sua palavra e dando voz e visibilidade às vidas das pessoas discriminadas e às situações de desigualdade, o Presidente da República pode ajudar a trazer para o primeiro plano da ação política a resolução de tais problemas sociais.

Como chefe supremo das Forças Armadas, acaso venha a ser o próximo PR, qual entende ser o papel das mulheres nas Forças Armadas?

Como Comandante Supremo das Forças Armadas entendo que o papel das mulheres é tão importante como o dos homens. Servem uma instituição que é um dos pilares fundamentais do Estado português.

É uma decisão recente, tem cerca de vinte anos, que se revelou muito positiva uma vez que deu igualdade de direitos e de deveres a todos os cidadãos, para além de ter introduzido fatores complementares que enriqueceram e humanizaram a instituição militar.

Quem é Sampaio da Novoa?

Sampaio da Nóvoa

Em criança revelou talento para jogar à bola e chegou a integrar os juvenis da Académica de Coimbra, mas foi como professor que fez carreira e se destacou. Tem dois doutoramentos (um em Ciências da Comunicação e outro em História Moderna e Contemporânea), foi consultor para a Educação do ex-Presidente da República Jorge Sampaio e entre 2006 e 2013 exerceu funções como reitor da Universidade de Lisboa. Hoje, aos 60 anos, é candidato à Presidência da República.

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