Carta Conjunta por Educação para a Cidadania e Educação Sexual Compreensiva

Educação para a Cidadania e Sexual
Destaque

A subscrição da Carta Conjunta por parte da P&D Factor e de diversas organizações da sociedade civil representa um posicionamento firme e coletivo em defesa da Educação para a Cidadania e Educação Sexual Compreensiva como pilares fundamentais para uma escola pública mais inclusiva, segura e promotora de direitos. Esta iniciativa surge em resposta à consulta pública sobre a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, alertando para lacunas graves na abordagem proposta, nomeadamente a ausência de conteúdos sobre igualdade de género e saúde sexual e reprodutiva. As entidades subscritoras defendem que estas dimensões são essenciais para o desenvolvimento integral dos jovens e para o cumprimento dos compromissos internacionais assumidos por Portugal.

A carta enviada ao Ministro da Educação e à Secretária de Estado da Igualdade sublinha a importância de uma linguagem inclusiva nos documentos oficiais e reivindica a integração explícita da igualdade de género e da educação sexual nos conteúdos curriculares. A omissão destas temáticas compromete não só a eficácia da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, como também enfraquece a capacidade da escola de prevenir abusos, promover o consentimento e garantir o bem-estar físico e emocional dos alunos. Ao exigir uma abordagem científica, pedagógica e alinhada com os referenciais da ONU e da UNESCO, esta ação conjunta reforça a urgência de políticas públicas que assegurem uma educação transformadora, capaz de combater estigmas, desigualdades e violências.

APMJ - Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania

Ex.mo Sr. Ministro da Educação, Ciência e Inovação,
Professor Doutor Fernando de Almeida Alexandre,

c/c
Ex.ma Sr.ª Secretária de Estado Adjunta da Juventude e da Igualdade

Lisboa, 24 de julho de 2025

Excelência,

As entidades subscritoras da presente missiva tomaram conhecimento detodo o teor das propostas de “Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania”e “Aprendizagens Essenciais de Cidadania e Desenvolvimento”, que se encontramem fase de consulta pública.

Sem prejuízo do oportuno envio de contributos para o necessário debatedesses dois documentos, consideraram as subscritoras ser seu dever cívico dirigir-se a VªExª para lhe dar conhecimento das suas observações sobre questões quereputam essenciais na estruturação dos referidos documentos.

Assim, atenta a natureza dos referidos documentos, estimam ser essencial àcorreta explanação e à apreensão de todo o seu conteúdo que a linguagemutilizada na sua redação seja conforme às prescrições normativas relativas à igualvisibilidade e relevância de mulheres e homens, como aliás o dispõem os TratadosInternacionais a que se encontra vinculado o Estado Português, mormente aConvenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Violência contra asMulheres, no seu artigo 5º, e a Convenção do Conselho da Europa para aPrevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica,comummente conhecida por “Convenção de Istambul”, nos seus artigos 6º e 12º.

Na verdade, sendo pacífico que é através da linguagem que se representa arealidade e se estrutura o pensamento, importa não apenas nomear de formaexpressa a existência da pluralidade da comunidade humana, como sobretudo é imprescindível não persistir na indicação do masculino como expressando ouniversal e o geral e o feminino como o particular e o específico, pois que tal legitimatodo o discurso de subordinação e hierarquização social.

E, consequentemente, é contrário ao dispositivo constitucional, consagrado noartigo 9º al. h) da Lei Fundamental, que faz impender sobre o Estado a tarefa dapromoção da Igualdade entre homens e mulheres.

Nesta conformidade, considera-se que a redação dos textos em análisedeveria ser reformulada por forma a obedecer aos ditames relativos à utilizaçãode uma linguagem inclusiva, designadamente aos indicados no “Manual deLinguagem Inclusiva”, aprovado pelo Conselho Económico e Social.

Do mesmo passo se entende que, para dar efetivo cumprimento ao escopo dadisciplina em causa, tal como este se encontra traçado na proposta de “EstratégiaNacional de Educação para a Cidadania” é necessário introduzir as matériasreferentes à Igualdade de Género, seja como uma das dimensões em que aqueledocumento aborda a Educação para a Cidadania, seja incluindo essa temática noâmbito da dimensão referente aos “Direitos Humanos” ou na intitulada“Democracia e Instituições Políticas”.

O fundamento ético, e jurídico, da imperiosidade desta pretensão advém dacircunstância de a sociedade humana ser constituída por mulheres e homens,titulares da mesma dignidade, o valor no qual assenta Portugal, de acordo com odisposto no artigo 1ºda Constituição da República.

Pelo que se insta VªExª a determinar a inclusão das matérias atinentes àIgualdade de Género no conjunto das temáticas da disciplina Cidadania eDesenvolvimento.

Considera-se, ainda, que a dimensão “Saúde”, constante do mesmodocumento, se mostra notoriamente fragilizada no tocante ao elenco dos temas deque se ocupará, na medida em que não contempla a educação sexualcompreensiva tal como recomendado em referenciais subscritos por Portugal nocontexto da OMS, UNESCO, UNICEF e UNFPA em sede das Nações Unidas, paraalém da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

Por outro lado, a sua exclusão enfraquece de forma gravosa o debate deconceitos e a promoção de comportamentos associados ao consentimento eresponsabilidade no contexto da saúde sexual e reprodutiva.

Ora sendo esta uma componente essencial do desenvolvimento de qualquerser humano não se julga ser concebível uma tal omissão.

Antes, dando cumprimento ao disposto na Lei nº60/2009 de 6 de Agosto, queestabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar, deveprever-se de forma clara e expressa um esclarecimento científico e pedagógico detodas as matérias em que se desdobra essa temática, essencial à realização dosDireitos Humanos em matéria de sexualidade, reprodução e bem-estar incluindo anecessária prevenção de IST (a crescer entre a população jovem), da gravidezadolescente e não desejada, da violência e abusos sexuais (maioritárias emcontexto familiar e grupo de pertença). Estas realidades revelam fragilidades nainformação e na prevenção, refletidas também nos contextos escolares.

A disciplina de Cidadania e Desenvolvimento e a Educação SexualCompreensiva em contexto escolar assumem, em nosso entender, um papelestruturante na promoção da Igualdade de Género e dos Direitos Humanos,permitindo trabalhar de forma sistemática num espaço seguro e em contextocientífica e pedagogicamente informado, adaptado a diferentes níveis etários econtribuindo para a desconstrução de comportamentos e práticas abusivas, quepodem ser normalizadas por discursos de desinformação, enfraquecendo adimensão de cidadania que a Escola pública deve promover.

Para construir uma sociedade mais justa, saudável e igualitária onde todasas pessoas possam exercer os seus direitos em plenitude de dignidade, respeito eresponsabilidade, os dados existentes reforçam a urgência de manter e fortaleceresta disciplina como espaço de ensino-aprendizagem que inclua temáticas como orespeito, o consentimento, a autonomia corporal, limites, identidade, empatia, asaúde, a menstruação, a saúde sexual e reprodutiva, autocuidado, prevenção daviolência, a legislação e os direitos humanos para uma escola mais segura,inclusiva e promotora de igualdade.

Face ao exposto, entende-se dever ser revisto o teor da supracitada dimensão“Saúde” da proposta de “Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania”.

Certas de que VªExª não deixará de ter em consideração todo o exposto, assubscritoras apresentam os seus melhores cumprimentos,

A Presidente da Direção da A.P.M.J.

Maria Teresa Féria de Almeida

Declaro, por minha honra, que a presente missiva recebeu também oassentimento e concordância das Associações adiante indicadas, as quais asubscrevem inteiramente.

P&D Factor - Associação para a Cooperação sobre População eDesenvolvimento
FEM - Feministas Em Movimento, Associação
Akto – Direitos Humanos e Democracia
APF - Associação para o Planeamento da Família
Cooperativa SEIES – questionar certezas, potenciar novos possíveis
Fundação Cuidar o Futuro
Inspiring Girls - Associação Portugal
PPdM -Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres
Com Alma - Associação Não Governamental pelos Direitos Humanos
CCC – Associação Corações Com Coroa
Núcleo Feminista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa